Vítimas lesadas em golpe imobiliário em Santa Maria criam associação para cobrar resoluções: veja a história de 5 deles

Foto: Alan Orlando (Diário)

Neste sábado (20), foi criada uma associação para representar as vítimas do caso envolvendo a Construtora Conceitual. Cerca de 40 pessoas participaram da assembleia, votaram a favor da criação da associação e indicaram os dez membros da diretoria. Antes de tomar essa decisão, o encontro foi marcado por desesperança, de pessoas que pagaram, mas não receberam os imóveis, e também por momentos de tensão e discussão, já que o grupo está dividido sobre quais encaminhamentos devem ser tomados daqui para a frente para tentar amenizar os prejuízos.

O objetivo da iniciativa é ganhar força e representatividade diante do que pode ser um dos maiores golpes imobiliários do Estado, noticiado com exclusividade pelo Diário, em 11 de janeiro. A estimativa é que cerca de 1,1 mil pessoas foram lesadas pela empresa, que não entregou nenhum dos quatro prédios vendidos em Santa Maria.

O rombo, que pode chegar aos R$ 70 milhões em prejuízos, foi descoberto após a morte do dono da construtora, Paulo Bertolo Moura, em novembro de 2023. O proprietário bateu o carro em uma pedra em um acidente de trânsito na BR-158.

A associação é formada pelos compradores de apartamentos e/ou garagens do Edifício Contemporani. A maioria do grupo, quase 70 pessoas, não possui registro desses imóveis e demanda uma resposta para resolver essa questão, além de outras, como o pagamento das multas que deixaram de ser feitas após a morte do proprietário.

O restante dos clientes, cerca de 40, haviam feito esse processo em cartório e não tem a mesma opinião. Eles entendem que a obra deve continuar e os prédios serem finalizados (veja mais abaixo).

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Na assembleia, foi orientado que cada pessoa procure um advogado para seguir com ação judicial individual. Isso porque a associação é apenas representativa e, até o momento, não há interesse no ingresso de uma ação judicial coletiva.

Como o grupo se formou

A enfermeira Angelita Rigon, 53 anos, comprou um apartamento com garagem, em 2012, no valor de R$ 141,2 mil. O investimento era para a família e para renda, principalmente. Ela relata que, diante da demora na entrega do prédio, passou a pressionar o proprietário da construtora e ir até a obra para tentar verificar o andamento.

– Era para estar pronto em 2015. Em 2022, comecei a ficar mais incisiva, nem sempre seu Paulo respondia. Sempre tinha uma desculpa, cada mês alguma coisa que deu problema, um cabo que não funcionou, um órgão público que não liberou e tinha que refazer – diz a enfermeira.

Foto: Alan Orlando (Diário)

Angelita começou a encontrar outros compradores que também estavam indo até o prédio para cobrar a entrega. Com as conversas, decidiram montar um grupo no final de outubro de 2023. O objetivo era solicitar, coletivamente, uma resposta da construtora.

Logo neste período, Angelita e o restante dos compradores já estavam encontrando problemas. Além da demora da obra, descobriram que alguns boxes das garagens estavam duplicados, ou seja, duas pessoas eram proprietárias. Porém, acreditavam que isso não se passava de um engano. Uma reunião foi marcada para definir o que estava faltando para o término dos prédios. Neste mesmo dia, o dono da construtora sofreu o acidente e faleceu.

– A partir disso, começaram a entrar cada vez mais compradores (no grupo). Fui fazendo uma tabela e só dava duplicação, duplicação… Muita coisa aconteceu nesse ínterim, respeitamos o tempo de luto, mas não conseguimos retorno do pessoal da construtora até agora. Temos, no momento, um monte de compradores, alguns com imóveis registrados, a maioria com apartamentos duplicados ou triplicados, sem ninguém para assinar escritura ou resolver. Então, decidimos criar a associação para nos unir, buscar um direito coletivo, ter visibilidade e representação porque todos somos vítimas dessa situação – afirma Angelita.

Outras vítimas

A gestora de administração Valdirene Soares, 47 anos, também conta que já vinha pedindo explicações para o proprietário da construtora há alguns anos. Ela e o marido compraram dois apartamentos, em 2015, com custo de cerca de R$ 350 mil. A família é de São Francisco de Assis. A ideia era que os filhos viessem estudar em Santa Maria e já tivessem um local para morar. Mais tarde, ela descobriu que um destes apartamentos já havia sido vendido, antes disso, em 2012, para outra pessoa. Depois, em 2020, a construtora teria vendido esse mesmo imóvel a um terceiro comprador.

Foto: Nathália Schneider (Diário)

– É muito complicado porque estamos dispondo de tempo e dinheiro. Temos pessoas no nosso grupo que visivelmente estão com a saúde mental extremamente afetada porque você tem que ser muito forte para aguentar tudo isso, porque não é só um investimento de dinheiro, mas emocional também. Nesse momento meu filho está pronto para vir morar em Santa Maria, fazer pré-vestibular e vamos ter que alugar outro imóvel, sendo que o nosso investimento foi feito, cumprimos com o que estava no nosso contrato e, infelizmente, sofremos esse golpe – lamenta Valdirene.

A autônoma Rafaella Costa, 27 anos, reside em Porto Alegre e se deslocou com o pai até Santa Maria para participar da assembleia. Ela lembra que o relacionamento da família com o proprietário começou antes da construção dos quatro prédios, já que a Conceitual construiu a casa em que a família morava em Santa Maria. Em 2017, o pai de Rafaella negociou a residência e mais R$ 250 mil por uma cobertura no Edifício Contemporani. No total, o investimento seria em torno de R$ 750 mil.

– Fiquei surpresa porque quando fiquei sabendo, falei para o pai, “acho que ele (Paulo) não vai ter feito isso com nós em específico, porque tínhamos uma relação com ele, sabe?”. Ele sempre foi muito sincero com meu pai e conhecia bem meu pai. Mas é um choque, né? Jamais imaginei que isso ia acontecer. Fico triste por toda a situação. Tinha tudo para dar supercerto. Já procuramos advogado e vamos ver quais vão ser os próximos passos para poder registrar, se vão conseguir ou não, até pela duplicidade da venda do apartamento – comenta Rafaella.

O empresário Francisco Armando Wiethan, 57 anos, fez negociações para uma permuta com o dono da construtora em 2014. O plano para o futuro era ter dois apartamentos para os filhos. Hoje, ele diz que tem prejuízos, pois está pagando aluguel em outro local para a filha morar.

– Surgiu a oportunidade de comprar um apartamento perto do Centro para minha filha. Acabei fazendo uma permuta, paguei uma diferença, ele (Paulo) me devia um monte de aluguel atrasados de uma outra obra e acabei recebendo dois apartamentos. Teve meses que ele me pagou aluguel, volta e meia eu negociava, conversava com ele. Me parecia uma pessoa que transmitia confiança e conhecimento. Só que ele começou a enrolar demais. Infelizmente, eu caí num golpe. Meu falecido pai sempre dizia, “tudo aquilo que tu não pode tocar, pegar, assegurar, não compra”. Eu contrariei meu falecido pai e comprei. Hoje temos uma situação bem delicada – detalha Francisco.

Grupos dos proprietários com registro imobiliário querem terminar a obra

Cerca de 40 pessoas que compraram apartamentos no Edifício Contemporani fizeram registro de imóvel. Esse grupo tem uma percepção diferente sobre o caso, pois querem finalizar a obra, ou seja, investir recursos próprios para concluir o prédio.

Edifício ContemporaniFoto: Nathália Schneider (Diário)

O advogado Edison Kronbauer, 51 anos, por exemplo, tem o registro de dois apartamentos com garagem, que comprou por cerca de R$ 300 mil, além de um carro que foi negociado. Ele participou da assembleia e explica o porquê o grupo defende que a obra tenha continuidade:

– Temos conhecimento que muitas das situações vão ter que ser solucionadas pelo Poder Judiciário. Até termos uma definição de quem são todos os proprietários, o prédio pode correr o risco de ficar parado, sem movimento, até porque o Contemporani falta muito pouco para ser terminado. O interesse principal dos registrados é concluir o prédio. Na realidade, todos nós fomos vítimas de um grande golpe, acredito que um dos maiores golpes de imóveis do Rio Grande do Sul, porém, existem situações diferentes. Quem tem o registro imobiliário, a lei civil garante a propriedade dessas unidades e para quem não tem registro, há uma indefinição.


Na tarde da última terça-feira, o escritório RMartins Advogados, de Porto Alegre, que representa a Conceitual Construtora, retornou o contato feito pelo Diário na quinta-feira anterior (11) e nos dias seguintes. Confira na íntegra:

"Os familiares do dono e administrador da Conceitual Construtora informam que estão tomando conhecimento a respeito da situação da empresa somente após o falecimento de Paulo, ocorrido em novembro/2023. Atualmente está em andamento um levantamento financeiro da empresa, para com isto, se verificar as medidas jurídicas que em breve serão adotadas, diante do cenário que será identificado."


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